Introdução
Dizem que “Felicidade é ter algo o que fazer, ter algo que amar e algo que esperar…”
O que é esperança?
“Ora, esperança que se vê não é esperança; pois o que alguém vê, como o espera?” (Rm 8.24b)
Esperança ou expectativa são termos que expressam, de um lado, o ato de “esperar”, porém, também incluem a ideia do “objeto esperado”. Esse objeto esperado é algo positivo e desejado, que ainda não se tornou real (Rm 8.24); baseado em promessas (Hb 10.23) ou possibilidade de tornar-se realidade, mesmo quando há indicações do contrário (Rm 4.18); e, com elementos confiáveis que sustentem esta esperança, caso contrário não passaria de sonho ou ilusão ou imaginação. “Anseio” é um termo que denota impaciência nessa espera ou desejo que o objeto se torne realidade o mais breve possível.
Esperança é a segunda das três “virtudes teologais” (tríade cristã primitiva ou os três elementos fundamentais da vida cristã) mencionada em 1Coríntios 13.13: “Agora, pois, permanecem a fé, a esperança e o amor, estes três; porém o maior destes é o amor.” Nenhuma dessas virtudes pode existir sem as demais.
Sentimento de culpa, pensamentos negativos, estresse, depressão, desânimo, conflitos relacionais, separação conjugal, ressentimentos, doença ou morte na família, perdas materiais, são alguns dos muitos problemas que podem roubar nossa paz, nossa qualidade de vida e precisam ser superados. Há muitas pessoas precisando reencontrar a alegria de viver; renovar o ânimo; reacender a chama da esperança: “E o Deus da esperança vos encha de todo o gozo e paz no vosso crer, para que sejais ricos de esperança no poder do Espírito Santo.” (Rm 15.13). Lembre-se que a verdadeira esperança é a nossa tábua de salvação para sair da crise! É ela que nos dá o fôlego para prosseguir na caminhada da vida (Is 40.31).
Você está sendo consumido pelas adversidades da vida? Como anda sua esperança? Em que consiste sua esperança? Como direcionar corretamente e fortalecer a esperança em tempos difíceis? Neste estudo procuraremos abordar alguns aspectos sobre a importância de conhecer e alimentar uma viva esperança (1Pe 1.3).
1. O SIGNIFICADO BÍBLICO DA “ESPERANÇA”
Cada povo, em cada época, e a humanidade como um todo, vive sua peculiar experiência de esperança.
1.1 – Esperança, no Antigo Testamento (AT)
O termo “esperança” ocorre 50 vezes no Antigo Testamento (AT), além de inúmeras ocorrências de outros termos que caracterizam a mesma ideia. Na história de Israel, registrada no AT, encontramos um povo diferenciado em sua crença – monoteísta, isto é, cultuando um só Deus, Javé, enquanto os outros povos eram idólatras, cultuavam vários deuses. Diante de tanta violência, invasões, guerras, inferioridade “militar” (por vezes), adversidades, o povo precisava contar com a ajuda do alto e refugiar-se em Deus. Diferentemente daqueles povos pagãos, Israel podia chamar Javé de “Esperança” e orar assim: “Pois tu és a minha esperança, SENHOR Deus,..” (Sl 71.5). E, Jeremias dizer: “Ó Esperança de Israel e Redentor seu no tempo da angústia,…” (Jr 14.8; ver tb Jr 17.13). Os israelitas esperavam pelo seu nome (Sl 52.9), pela sua palavra de perdão (Sl 130.5), pelo seu braço forte (Is 51.5), pela sua salvação (2Sm 22.3). Os profetas vaticinaram a restauração da “sorte de Israel” (Jr 31.23). A vinda do Messias é prometida e esperada desde Gênesis 3.15 e ratificada ao longo do AT (Dt 18.15-19; 2Sm 7.16; Sl 2; Sl 16.10; Sl 22; Is 4.2-6; Is 7.13-14; Is 9; Is 60.1-2; Ez 34; Dn 9.24-27; Mq 5.2-5; Zc 6.13; 9.10 etc.).
1.2 – Esperança, no Novo Testamento (NT)
O termo “esperança” ocorre 55 vezes no Novo Testamento (NT), além de inúmeras ocorrências de outros termos que caracterizam a mesma ideia. No grego, o substantivo “esperança” é “elpis” e o verbo “esperar” é “elpizõ” . É curioso que a palavra “esperança” não apareça nos Evangelhos e no Apocalipse. Ocorre em Atos (8 vezes), nas epístolas paulinas (38 vezes) e, nas epístolas gerais (9 vezes). Portanto, a ênfase se acha nos escritos de Paulo.
Enquanto no AT se convivia com o “ainda não” da realização da salvação, no NT o Messias já veio e inaugurou o “hoje sim, porém, ainda não” no que se refere à salvação eterna e todas as bênçãos, presentes e futuras, dela decorrentes. “Aquilo que antes era futuro agora se tornou presente nele para a fé: a justificação, o relacionamento com Deus como filho dele, a habitação do Espírito Santo na pessoa, o novo povo de Deus que se compõe de crentes de Israel e das nações.”[1] (E. Hoffmann)
No NT, os cristãos também reconhecem que Javé é o Deus da esperança (Rm 15.13). E que este constituiu a Jesus Cristo, seu Filho, como nossa esperança (1Tm 1.1; 4.10).
2. A ESPIRAL DA ESPERANÇA
“E não somente isto, mas também nos gloriamos nas próprias tribulações, sabendo que a tribulação produz perseverança; e a perseverança, experiência; e a experiência, esperança.” (Rm 5.3-4)
Sabemos, perfeitamente, que é de provação e aflição a nossa vida aqui. Jesus nos preveniu a esse respeito: “Estas coisas vos tenho dito para que tenhais paz em mim. No mundo, passais por aflições; mas tende bom ânimo; eu venci o mundo.” (Jo 16.33). Nesta mesma linha o apóstolo Paulo acrescenta: “Porque a nossa leve e momentânea tribulação produz para nós eterno peso de glória, acima de toda comparação,” (2Co 4.17). O apóstolo também nos apresenta uma espécie de “espiral da esperança” no texto de Romanos 5.3-4: Tribulação -> Perseverança -> Experiência -> Esperança.
No texto de Romanos 8.18-25 destacam-se alguns aspectos tristes e desfavoráveis dessa nossa transitória vida terrena, tais como: a realidade do sofrimento do tempo presente; a sujeição da criação à vaidade; o jugo do cativeiro da corrupção; o gemido da criação por conta da maldição desde a queda no Éden, o que inclui os remidos do Senhor que aguardam a redenção do corpo, a redenção completa. É daí que provém a nossa angústia, que pela graça de Deus pode ser superada pela esperança em tudo o que o Senhor já fez, está fazendo e ainda fará por nós. Ele não nos deixou só no enfrentamento das tormentas desta vida: “E eis que estou convosco todos os dias até à consumação do século.” (Mt 28.20b). E, ainda mais, somos desafiados e exortados a mantermos firme a nossa fé e confiança no Senhor, para podermos permanecer de pé no dia mau: “Os que confiam no SENHOR são como o monte Sião, que não se abala, firme para sempre.” (Sl 125.1).
3. ESPERANÇA E PACIÊNCIA
Enquanto aguardamos a manifestação dessa redenção prometida é necessário aguardar, com paciência (Rm 15.14) e perseverança, crendo que quem prometeu não há de falhar. Em vez de olharmos para as circunstâncias negativas precisamos manter o foco na missão recebida, renovando nossas forças e motivação na promessa divina: “Porque para mim tenho por certo que os sofrimentos do tempo presente não podem ser comparados com a glória a ser revelada em nós.” (Rm 8.18). Se aquilo que está diante de nós, se aquilo que vemos só nos traz tristeza e desalento, é preciso exercitar a paciência, fixando-nos naquilo que ainda não vemos, perseverando na esperança da intervenção divina, no tempo por ele determinado (Rm 8.25).
4. ESPERANÇA E RAZÃO
“Abraão, esperando contra a esperança, creu, para vir a ser pai de muitas nações, segundo lhe fora dito: Assim será a tua descendência.” (Rm 4.18)
Por vezes a “esperança” há de duelar com a “razão”, isto é, quando a esperança desafia a lógica humana. Não se pode perder de vista que a esperança não se submete à razão pois a ela transcende. A lógica humana se expressa com base em condições e possibilidades verificadas no mundo material e racional. Entretanto, a realidade humana também está sujeita a elementos que transcendem o natural e material, ou seja, ao sobrenatural. Deus é o Deus dos impossíveis e nada pode limitar sua ação (Mt 19.26; Mc 10.27; Lc 1.37; 18.26-27).
A referência no texto bíblico acima a Abraão ilustra perfeitamente essa relação entre esperança e razão. “Esperando contra a esperança”, isto é, quando a razão e a lógica humanas negavam qualquer possibilidade de Sara engravidar, o humanamente impossível se rendeu à sempre possível e irresistível ação divina. Portanto, diante dessa verdade incontestável, nossa esperança deve se renovar e fortalecer.
Diante dos maiores desafios e adversidades, algumas pessoas cedem lugar ao pessimismo e se entregam ao desânimo. Por outro lado, o verdadeiro cristão não se intimida e não recua, por mais desfavoráveis e graves que sejam as circunstâncias. Porque a esperança cristã surpreende e supera qualquer dificuldade, inclusive a morte: “Disse-lhe Jesus: Eu sou a ressurreição e a vida. Quem crê em mim, ainda que morra, viverá;” (Jo 11.25).
5. A ESPERANÇA CRISTÃ
Alguns aspectos da esperança cristã são assim descritos no NT:
– A esperança da ressurreição dos justos e injustos (At 24.15).
– A esperança da glória de Deus (Rm 5.2).
– Uma esperança inconfundível (Rm 5.5).
– A esperança da remissão do cativeiro da corrupção (Rm 8.21).
– A esperança que nos traz regozijo (Rm 12.12).
– A esperança que nos vem pela consolação das Escrituras (Rm 15.4).
– A esperança que transcende os portais desta vida terrena (1Co 15.19).
– Uma só esperança da nossa vocação em Cristo Jesus (Ef 4.4).
– Uma esperança que nos está preservada nos céus (Cl 1.5).
– A esperança que nos vem do Evangelho (Cl 1.23).
– A esperança que se sustenta em Cristo (1Ts 1.3).
– A esperança que nos equipa com o capacete da salvação (1Ts 5.8).
– A esperança da vida eterna prometida antes dos tempos eternos (Tt 1.2; 3.7).
– Uma esperança superior pela qual nos chegamos a Deus (Hb 7.19).
– Uma viva esperança (1Pe 1.3).
– Uma fé e esperança postas em Deus (1Pe 1.21; 1Jo 3.3).
– Uma esperança que deve ser explicada à tantos quantos a questionarem (1Pe 3.15).
Não há que duvidar quanto a essa bendita esperança. Na caminhada rumo à maturidade cristã devemos percorrer uma outra espiral, a espiral das confissões da esperança cristã declaradas pelo apóstolo Paulo: “cremos” (gr. pisteuomen)(Rm 6.8); “Estou bem certo” (gr. pepeismai)(Rm 8.38); e, “Estou plenamente certo” (gr. pepoithos)(Fp 1.6). O cristão, tendo a plena certeza de que serão concretizadas as promessas divinas, algumas aqui e agora, e outras, lá e então, gloria-se na sua esperança, pois “… o Deus que não pode mentir prometeu antes dos tempos eternos” (Tt 1.2).
“Se a nossa esperança em Cristo se limita apenas a esta vida, somos os mais infelizes de todos os homens” (1Co 15.19).
A esperança cristã é aquele elo e ponte que interliga o tempo presente (marcado por sofrimentos) com a consumação do futuro escatológico (tempo de glória). A esperança cristã nos conclama a esperar com paciência, disciplina e confiança até a nossa chamada à casa do Pai Celestial, ou a manifestação gloriosa do Senhor Jesus na sua Segunda Vinda. Enquanto esperamos, vivemos uma vida abundante e vitoriosa em Cristo Jesus (Rm 8.37; 1Co 15.57; 2Co 2.14).
Conclusão
Quando se é iludido com a percepção de que se tem tudo, nada se espera; quando se acha que se tem muito, pouco se espera; quando se reconhece que o que se tem nada é, tudo se espera! Esta vida terrena é passageira e nada é quando comparada ao que Deus tem preparado para aqueles que o amam (1Co 2.9).
“Por isso, não desanimamos; pelo contrário, mesmo que o nosso homem exterior se corrompa, contudo, o nosso homem interior se renova de dia em dia. Porque a nossa leve e momentânea tribulação produz para nós eterno peso de glória, acima de toda comparação, não atentando nós nas coisas que se veem, mas nas que se não veem; porque as que se veem são temporais, e as que se não veem são eternas. (2Co 4.16-18)
Que a presente vida terrena está envolta em dificuldades e sofrimentos, não há dúvida; muito embora possamos desfrutar de bons momentos de refrigério e regozijo. Entretanto, o que nos está reservado no porvir mantém acesa a nossa esperança. Embora a espera seja dolorosa, esta pode ser vista de forma animadora quando comparada com o “trabalho de parto”. A dor e sofrimento da parturiente é compensada pela alegria de ter em seus braços aquele pequenino ser por ela gerada.
Finalmente, vale lembrar que a esperança é comparada a uma “âncora da alma” (Hb 6.18-19). “Assim como o navio fica seguro quando está no ancoradouro, nossa vida se firma na esperança que nos liga a Cristo, nosso grande Sumo Sacerdote que entrou no santuário.” [2] (E. Hoffmann)
“Espera pelo SENHOR, tem bom ânimo, e fortifique-se o teu coração; espera, pois, pelo SENHOR.” (Sl 27.14)
Que Deus nos ajude!
Bibliografia:
1. Bíblia Sagrada (SBB – Versão Revista e Atualizada).
2. Bíblia Online – SBB.
3. Revista Didaquê – Vida Abundante – DE BEM com a vida.
4. Dicionário Internacional de Teologia do Novo Testamento, 1985, Vol. II.
5. Internet.
[1] Dicionário Internacional de Teologia do Novo Testamento, 1985, Vol. II, Pg.117
[2] Dicionário Internacional de Teologia do Novo Testamento, 1985, Vol. II, Pg.120