Os seres humanos têm alguns comportamentos interessantes. Um deles é o exibicionismo, aquela necessidade de se mostrar para os outros. Acho que todos têm um pouco disso, uns mais, outros menos. Isso se manifesta das formas mais variadas possíveis e você sabe muito bem como é, ou como isso acontece. Pode ser aquele sobrenome diferenciado, imponente, ou o bairro nobre onde mora. Pode ser aquela faculdade de renome, os títulos que possui ou os idiomas que fala. Pode ser aquele parente importante que tem, ou aquele vestuário de grife. Podem ser aquelas viagens internacionais ou aquele carrão, no qual desfila. Pode ser o luxo da festa de 15 anos da filha ou do casamento ou das bodas e, até mesmo, o cemitério e jazigo onde a família sepulta seus mortos. Enfim, pode ser tanta coisa… E, onde isso acontece? Antigamente era no mundo real, mas hoje, com a tecnologia disponível, até virtualmente, nas redes sociais e aplicativos. Aliás, antes de postar alguma coisa no facebook deveríamos nos fazer as seguintes perguntas: 1) Isso vai glorificar a Deus? 2) Isso é útil e vai abençoar as pessoas? 3) Estou apenas expressando aqui o meu contentamento ou estou querendo me exibir? “Desvia os meus olhos, para que não vejam a vaidade, e vivifica-me no teu caminho.” (Sl 119.37)
Alguém já te fez aquelas solenes perguntas: De que igreja você é? Quem é o teu pastor? Pois é, para se sair bem nessas horas, tem gente que faz questão de fazer parte de uma igreja com templo majestoso, com pastor famoso. Tudo isso tem a mesma origem: a necessidade de ser visto pelo outro como alguém muito importante, especial.
Não há nenhum mal em buscar o melhor para as nossas vidas, porém não podemos perder de vista aquilo que realmente tem valor, agora e eternamente. Não devemos nos encantar apenas com aquelas coisas que impactam a visão, mas, principalmente, com as que trazem significado profundo à existência.
Como Jesus reagiu ao que era o motivo de orgulho dos judeus, o Templo de Jerusalém? “Tendo Jesus saído do templo, ia-se retirando, quando se aproximaram dele os seus discípulos para lhe mostrar as construções do templo. Ele, porém, lhes disse: Não vedes tudo isto? Em verdade vos digo que não ficará aqui pedra sobre pedra que não seja derribada.” (Mt 24.1-2). Certamente não foi com o mesmo entusiasmo dos discípulos. Muitos, ainda hoje, não entenderam o que o Filho e o Pai pensam sobre templos bonitos: “Entretanto, não habita o Altíssimo em casas feitas por mãos humanas; como diz o profeta: O céu é o meu trono, e a terra, o estrado dos meus pés; que casa me edificareis, diz o Senhor, ou qual é o lugar do meu repouso? Não foi, porventura, a minha mão que fez todas estas coisas?” (At 7.48-50). Os discípulos estavam diante do Deus encarnado que “tabernaculou” (habitou) entre eles (Jo 1.14), varão aprovado por Deus diante deles com milagres, prodígios e sinais (At 2.22) e estavam tão impressionados com construções humanas. Poucos entendem que nesse tempo da Graça, nós é que somos templo de Deus (Jo 14.23), morada do Espírito Santo (Jo 14.17), ou conforme disse o apóstolo Paulo: “logo, já não sou eu quem vive, mas Cristo vive em mim;” (Gl 2.20a).
E, o que dizer de Pastores e Estrelas?
1. Os pastores de Belém e a Estrela
Quando você leu o título, talvez tenha vindo, imediatamente, à sua mente a história do nascimento de Jesus. A narrativa bíblica fala de uma estrela diferente que brilhou no céu e de pastores no campo. O curioso disso é que, segundo essas narrativas, os pastores de Belém nada têm a ver com essa estrela! Se você prestar bastante atenção verá que: a) Essa estrela diferente é citada apenas por Mateus (quatro vezes), servindo de guia para conduzir os magos do oriente até Jesus (Mt 2.1-12). Esses magos eram estudiosos dos astros. b) Já os pastores de Belém foram citados apenas por Lucas (Lc 2.8-20). Em parte alguma da narrativa bíblica é mencionado que esses pastores viram ou foram guiados ao menino nascido, por essa estrela. Os anjos lhes anunciaram o nascimento de Jesus e lhes deram todas as dicas de como encontrá-lo. c) Ambos os grupos, magos e pastores, foram até Jesus (a verdadeira Estrela) e o encontraram.
Vamos refletir um pouco sobre Estrela.
a) Por definição, estrela é um astro que tem luz própria. O apóstolo Paulo, escrevendo sobre o corpo ressurreto, ilustra a diferença de esplendor, assim: “Uma é a glória do sol, outra, a glória da lua, e outra, a das estrelas; porque até entre estrela e estrela há diferenças de esplendor.” (1Co 15.41). É claro que a lua não é uma estrela, pois reflete a luz do sol.
b) Estrelas e astros não devem ser adorados, como muitos povos faziam, pois não são deuses, mas criação do único Deus vivo e verdadeiro: “Guarda-te não levantes os olhos para os céus e, vendo o sol, a lua e as estrelas, a saber, todo o exército dos céus, sejas seduzido a inclinar-te perante eles e dês culto àqueles, coisas que o SENHOR, teu Deus, repartiu a todos os povos debaixo de todos os céus.” (Dt 4.19)
c) Na simbologia bíblica, estrela pode ser interpretada como:
- Sinal ou aviso, como a estrela vista pelos magos (Mt 2.1-12).
- As doze tribos de Israel (Ap 12.1).
- Pessoas importantes, como os onze irmãos, no sonho de José (Gn 37.9).
- Pessoas sábias, iluminadas: “Os que forem sábios, pois, resplandecerão como o fulgor do firmamento; e os que a muitos conduzirem à justiça, como as estrelas, sempre e eternamente.” (Dn 12.3).
- Uma referência aos anjos caídos na rebelião de Lúcifer (Ap 12.4, 9). Por extensão, os falsos líderes que agem na mesma linha (Jd 13).
- Uma referência a Jesus Cristo, o Messias prometido: “Vê-lo-ei, mas não agora; contemplá-lo-ei, mas não de perto; uma estrela procederá de Jacó, de Israel subirá um cetro que ferirá as têmporas de Moabe e destruirá todos os filhos de Sete.” (Nm 24.17)
d) Estrela da alva ou da manhã:
- Uma referência a Vênus, o segundo planeta do Sistema Solar, a partir do Sol. Depois da Lua, é o objeto mais brilhante do céu noturno. Como Vênus se encontra mais próximo do Sol do que a Terra, ele pode ser visto aproximadamente na mesma direção do Sol. Vênus atinge seu brilho máximo algumas horas antes da alvorada ou depois do ocaso, sendo por isso conhecido como a estrela da manhã (Estrela d’Alva) ou estrela da tarde (Vésper) (Wikipédia).
- Uma referência a Satanás, o “luminoso”: “Como caíste do céu, ó estrela da manhã, filho da alva! Como foste lançado por terra, tu que debilitavas as nações! Tu dizias no teu coração: Eu subirei ao céu; acima das estrelas de Deus exaltarei o meu trono e no monte da congregação me assentarei, nas extremidades do Norte; subirei acima das mais altas nuvens e serei semelhante ao Altíssimo.” (Is 14.12-14). Endossada por Cristo: “Mas ele lhes disse: Eu via Satanás caindo do céu como um relâmpago.” (Lc 10.18; ver tb Ap 20.3 e 1Tm 3.6). E, como diz Paulo: “E não é de admirar, porque o próprio Satanás se transforma em anjo de luz.” (2Co 11.14).
- Uma referência a Jesus, a brilhante Estrela, com “E” maiúsculo: “Eu, Jesus, enviei o meu anjo para vos testificar estas coisas às igrejas. Eu sou a Raiz e a Geração de Davi, a brilhante Estrela da manhã.” (Ap 22.16).
- Uma dádiva de Jesus “ao vencedor”, referindo-se, talvez, a poder real ou autoridade: “assim como também eu recebi de meu Pai, dar-lhe-ei ainda a estrela da manhã.” (Ap 2.28).
- Uma referência aos vários estágios de luz da revelação divina: “Temos, assim, tanto mais confirmada a palavra profética, e fazeis bem em atendê-la, como a uma candeia que brilha em lugar tenebroso, até que o dia clareie e a estrela da alva nasça em vosso coração,” (2Pe 1.19). As profecias do Antigo Testamento simbolizando a candeia; o cumprimento da profecias na primeira vinda de Cristo, simbolizando a estrela da alva; por fim, a segunda vinda de Cristo, nosso Sol da Justiça (Ml 4.2), trazendo toda a claridade.
Retornando aos pastores de Belém (Lc 2.8-20), temos de admitir que algumas coisas nos impressionam na narrativa:
1ª) O fato de Deus ter se importado com aqueles humildes e simples pastores, homens do campo, enviando-lhes o seu anjo (acompanhado de uma multidão da milícia celestial) para anunciar o nascimento do Deus homem, do Salvador, do Bom Pastor (Jo 10.11), do Supremo Pastor (1Pe 5.4), do descendente de Davi (Mt 1.1) o pastor de ovelhas que se tornou o pastor de Israel; na cidade de Davi.
2ª) O fato desses pastores terem ido, apressadamente a Belém, para terem um encontro com aquele que é o Pastor dos pastores.
3ª) O fato desses pastores, depois do encontro com Jesus, proclamarem a todos a revelação que receberam a respeito de Jesus.
4ª) O fato desses pastores glorificarem e louvarem a Deus pelo que ouviram e viram de Jesus.
Que belo exemplo para todos aqueles líderes de igreja, pastores e presbíteros, seguirem!!! Centralidade total em Jesus! Satisfação completa em Jesus!
2. Estrelas na mão direita de Jesus
“Tinha na mão direita sete estrelas, e da boca saía-lhe uma afiada espada de dois gumes. O seu rosto brilhava como o sol na sua força.” (Ap 1.16)
“Quanto ao mistério das sete estrelas que viste na minha mão direita e aos sete candeeiros de ouro, as sete estrelas são os anjos das sete igrejas, e os sete candeeiros são as sete igrejas.” (Ap 1.20)
A primeira grande revelação do Apocalipse refere-se à visão que João teve do Senhor, ressurreto, no meio dos sete candeeiros de ouro, isto é, as sete igrejas da Ásia Menor, interpretação essa declarada no próprio texto. A igreja sofredora carecia de uma nova visão do Senhor, uma esplendorosa visão do Jesus Glorificado, para seu alento. Na visão tudo tem significado. Os elementos vistos e a posição de Jesus transmitem a mensagem de um Jesus presente, soberano, governante e protetor da sua igreja. A descrição do “Filho do Homem” e suas vestes, entretecem uma imagem de inigualável resplendor e majestade que deveria causar nos leitores uma sensação de confiança e segurança, restaurando-lhes a esperança e encorajando-os na luta pela causa da fé.
Entre as interpretações sugeridas pelos comentaristas bíblicos para essas “sete estrelas” ou “sete anjos” na mão direita de Jesus, citamos duas:
1ª) É uma referência a anjos literais. A palavra grega (aggeloi), traduzida por anjos, ocorre, pelo menos, 23 vezes no Novo Testamento. Em todas as outras 22 ocorrências fica claro tratar-se de referências literais a seres angelicais, por que aqui seria diferente? Assim como na Bíblia há a ideia de anjos guardando crianças (Mt 18.10) e outras pessoas (Sl 91.11; At 12.15); anjos e arcanjos guardando nações (Dn 12.1); não seria um absurdo considerar anjos guardiões de igrejas locais, aqui figuradamente citados.
2ª) É uma referência a pastores, líderes das referidas igrejas locais. Afinal, não faria sentido o apóstolo João ser orientado a escrever cartas para anjos literais.
Vale ressaltar que naquela ocasião, ainda não existia a figura de pastor de igreja, como temos hoje. Cada igreja local era liderada por presbíteros. Temos que tomar cuidado com teologia reversa. Mas, admitamos, por hipótese, que a referência seja a pastores de igreja. Então, consideremos esses pastores, não como estrelas, astros que têm luz própria, mas autoridades constituídas para pastorearem igrejas locais. Assim, podemos identificar através da visão que, na perspectiva divina, o lugar de um pastor é na mão direita de Jesus. Certamente, isso fala de um lugar de honra, mas também de dependência e submissão ao Senhorio de Cristo. Ele não está livre e solto para fazer o que quer!
3. Pastores-estrela
Concluindo esta abordagem, sem perder de vista as colocações iniciais sobre exibicionismo, na minha singela opinião, considero que nenhuma igreja local deveria se encantar com Pastores-estrela. Pastores-estrela são aqueles líderes de igreja famosos que querem brilhar mais do que Jesus, que querem ter luz própria. Apresento, a seguir, pelo menos sete razões para isso:
1ª) Eles apascentam a si mesmos e não as ovelhas do Senhor.
2ª) Eles estão mais interessados nos seus projetos pessoais, do que nos projetos de Deus para a igreja.
3ª) Eles custam muito caro para a igreja, quer pelas elevadas côngruas ou remunerações que recebem, quer pelos recursos que demandam e drenam da organização (humanos, materiais e financeiros).
4ª) Eles não têm tempo para pastorear o rebanho, para estar junto com as ovelhas, pois sua agenda de compromissos externos à igreja é imensa.
5ª) O foco deles não é pastorear ovelhas, cuidar delas, mas se apresentar em público.
6ª) Eles não têm cheiro de ovelha, mas podem até ter cheiro de enxofre, quando intentam subtrair a Glória que somente a Deus é devida.
7ª) Eles podem até manter a igreja cheia de gente e de religiosidade, mas zelar pela santidade dos membros não é o forte deles.
Finalmente, vale ressaltar:
– Jesus é o nosso Verdadeiro e Supremo Pastor. Não perca Jesus na caminhada! Somente ele é “O” Cabeça (relação hierárquica) e “A” Cabeça (relação de dependência) da Igreja!
– Não se anule, idolatrando líderes eclesiásticos. Idolatria é pecado! O Espírito Santo foi derramado sobre toda a igreja, distribuindo dons aos remidos do Senhor. Líderes e liderados, todos somos membros e parte do Corpo de Cristo – a Igreja.
– Além de ser parte do Corpo de Cristo, a igreja local também é uma instituição, com CNPJ, Estatutos etc. Como tal, requer de todos nós respeito e obediência às autoridades ali legalmente instituídas.
– Precisamos sim, de pastores de almas, vocacionados, chamados e capacitados por Deus para tão nobre missão: apascentar as ovelhas do Senhor Jesus Cristo.
“Lembrai-vos dos vossos guias, os quais vos pregaram a palavra de Deus; e, considerando atentamente o fim da sua vida, imitai a fé que tiveram. Obedecei aos vossos guias e sede submissos para com eles; pois velam por vossa alma, como quem deve prestar contas, para que façam isto com alegria e não gemendo; porque isto não aproveita a vós outros.” (Hb 13.7, 17)