Olhos abertos, Joelhos dobrados

Texto base: Gênesis 2.24

Introdução          

O título proposto para este estudo e sua vinculação ao casamento nos desafia a pensar em várias e interessantes situações e aplicações. Podemos dizer, sem correr o risco de nos afastarmos de uma boa interpretação ou visão da realidade que “abrir os olhos” nos remete a uma dimensão humana e material/natural, enquanto “joelhos dobrados” a uma dimensão divina e espiritual/sobrenatural. Para entrar e se manter num relacionamento amoroso, seja de namoro ou de casamento, há que se apropriar ou buscar recursos em ambas as dimensões.

Não são poucos os casos de desilusões e de decepções que acontecem nos namoros e casamentos, deixando um rastro de tristeza e amargura. Relacionamento conjugal é coisa séria e requer atenção, cuidado e prevenção. É preciso avaliar com cuidado se é a pessoa certa para se namorar ou se casar. É preciso avaliar o grau de compromisso, sinceridade e fidelidade que o(a) outro(a) tem com Deus e está disposto(a) a estabelecer com você. É preciso que ambos entendam a importância de uma relação sadia, duradoura e abençoada por Deus!

Neste estudo continuaremos a tratar daqueles aspectos que favorecem uma melhor compreensão do que significa: uma vida a dois, o deixar a família e se unir ao seu cônjuge; a boa tomada de decisão na escolha do cônjuge; o alinhamento de propósitos de vida e o ajuste de expectativas; a presença e participação efetiva de Deus na família; a melhor forma de lidar com as divergências e os conflitos; a importância de viver os valores e princípios cristãos.

1. DEIXAR E UNIR-SE

“Por isso, deixa o homem pai e mãe e se une à sua mulher, tornando-se os dois uma só carne.” (Gn 2.24)

1.1 Deixar

“Por isso, deixa o homem pai e mãe….”

O casamento requer uma separação efetiva e renúncia, de cada cônjuge  da sua família original. É preciso cortar o “cordão umbilical” que nos liga à “placenta familiar” para, então,  permitir a formação de uma nova “placenta familiar”, uma nova família. E isso se dá em pelo menos três dimensões:

a) Geográfica

Ao se casar, não viva com seus pais, não more com seus sogros!

Você conhece aquela máxima popular: “Feliz foi Adão, que não teve sogra”. É isso aí…

A primeira dimensão – geográfica – diz respeito à mudança de endereço. Pode parecer irrelevante, porém é fundamental para se evitar a interferência da família original, na nova família em formação. Se economicamente isso não for viável, tenha consciência, pelo menos, do risco de complicações em seu casamento.

b) Financeira

Ao se casar, não dependa financeiramente do seu pai ou sogro ou de qualquer outro parente.

A segunda dimensão – financeira – diz respeito à independência econômica do casal. Quem sustenta tem o direito de opinar e pode chegar a interferir!

c) Emocional

Ao se casar, nunca compare a comida da sua esposa com a da sua mãe, tia, avó. Não vá procurar tratar suas carências emocionais com pai, mãe, amigos. Faça isso diretamente com seu cônjuge.

A terceira dimensão – emocional – diz respeito à independência emocional do casal. O casal precisa exercitar e amadurecer uma santa cumplicidade no trato de suas questões emocionais.

1.2 Unir-se

“… e se une à sua mulher, tornando-se os dois uma só carne.”
“De modo que já não são mais dois, porém uma só carne. Portanto, o que Deus ajuntou não o separe o homem.” (Mt 19.6)

É interessante conferir o significado da palavra Unir (Casar), no hebraico e no grego, para entender o significado do casamento:

DAVAK (hebraico – AT), tem o sentido de FENDER, COBRIR (coito) (Gn 2.24).

PROSKOLLAU (grego – NT), tem o sentido de COLAR, ADERIR (Mt 19.5; Ef 5.31).

Há casamento civil, como satisfação à Sociedade. Há casamento religioso, para buscar as bênçãos de Deus. Há também o casamento na cama. É no ato sexual que efetivamente se dá a consumação do casamento, do DAVAK. Cada vez que o ato sexual se repete, o casal está celebrando essa união. Mas é no primeiro ato, onde se dá a perda da virgindade, com provável sangramento, que fica claramente simbolizado o Pacto ou Aliança de Sangue. Isso é o “normal”, embora não seja “comum”. Falar em virgindade hoje em dia é caretice, machismo, dominação da mulher etc. Entretanto, na Bíblia representa virtude, pureza e beleza. Na cultura judaica, o homem que descobrisse que a moça com quem se casou não era virgem, poderia entregá-la para ser apedrejada, à porta da casa do pai dela (Dt 22.21).

O ato sexual simboliza bem o tornar-se uma só carne. Há muito mais neste símbolo do que o aspecto físico ou sexual. Deve haver uma verdadeira colagem ou adesão, de propósitos, de interesses, enfim, de vidas. São como duas folhas de papel, coladas, que, quando se tenta descolar, se rasgam. Unir-se significa compartilhar a vida, os bons e maus momentos; caminhar na mesma direção motivados por um grande amor; perseguindo propósitos compartilhados por ambos.  

2. OLHOS ABERTOS

Há um sentido figurado na expressão “olhos abertos’, ou seja, de ficar atento, vigilante; de observar algo cuidadosamente, sem se distrair; de manter plena consciência da situação. Esta expressão vem desde o Jardim do Eden, quando a serpente disse à Eva: “…. É certo que não morrereis. Porque Deus sabe que no dia em que dele comerdes se vos abrirão os olhos e, como Deus, sereis conhecedores do bem e do mal.” (Gn 3.4b-5). E, com a queda, isso aconteceu; foi-se a inocência e veio a consciência: “Então, disse o SENHOR Deus: Eis que o homem se tornou como um de nós, conhecedor do bem e do mal; …” (Gn 3.22a). E, esse discernimento, entre o bem e o mal, entre o certo e o errado, entre o que é melhor ou pior,  entre o que é mais ou menos importante, é extremamente necessário em todas as situações e decisões da vida, principalmente em se tratando de namoro e casamento!  

 É preciso manter os olhos bem abertos:

2.1 Para o que é mais importante

O que é mais importante? Jesus Cristo e os princípios bíblicos, ou o cônjuge e um casamento de qualquer jeito?

O verdadeiro e autêntico cristão:

  • Se submete ao senhorio de Cristo e à sua vontade em primeiro lugar.
  • Há de priorizar sua fé e valores em vez de se submeter a um relacionamento que tem tudo para dar errado.
  • Procura evitar o “jugo desigual” ou “casamento misto” porque conhece a orientação bíblica (2Co 6.14-16) e, porque percebe o alto risco de conflitos e as consequências da sua escolha que se estenderão pelo restante da sua vida.
  • Tem sua vida dirigida pelo Espírito Santo, e luta para não ser dominado por paixões loucas.
  • Procura renunciar seus apetites carnais, por amor a Cristo.
  • Vive a alegria de sua união com Cristo o que lhe poupa muitos sofrimentos e dor de más escolhas e decisões inconsequentes.   

2.2 Para o que fazer

O que as pessoas pensam do casamento e de como vivenciá-lo, na prática?

O tempo de namoro e noivado é muito propício para discutir algumas questões:

  • Que recursos financeiros têm e como vão administrá-los?
  • Onde vão morar e qual igreja vão frequentar?
  • Pretendem ter filhos? Quantos?
  • Como vão conciliar a carreira profissional com a vida familiar?
  • Como vão criar e educar os filhos?
  • Como vão lidar com a interferência dos pais, parentes e amigos na vida familiar?

Essas são apenas algumas, dentre as muitas questões a serem conversadas. É claro que um casal não conseguirá antecipar e debater todas as questões que envolverão o seu futuro casamento, entretanto, a predisposição demonstrada para a conciliação de objetivos já servirá de sinalização muito positiva.

3. JOELHOS DOBRADOS

“Por esta causa, me ponho de joelhos diante do Pai,” (Ef 3.14)

“Joelhos dobrados” é uma expressão que nos remete à uma dimensão espiritual, particularmente à oração e à presença de Deus, no casamento.

Muitos são os itens e providências necessárias que envolvem a celebração civil e religiosa do casamento, a festa, a lua de mel, a nova moradia do casal etc. Entretanto, é preciso, acima de tudo, não descuidar de alguns aspectos essenciais que envolvem o preparo espiritual de cada cônjuge que deve começar muito antes da data do casamento.

Para que muitos casamentos não sucumbam devido a um mau começo ou por conta da pressão das dificuldades ou do desgaste do tempo, vale dobrar os joelhos diante de Deus e diante da sua Palavra. É preciso investir espiritualmente, vigiar e orar, para que a “viagem do casamento” transcorra de forma segura, tranquila, prazerosa e bem-sucedida!  

É preciso nos dobrarmos:

3.1 Para obedecer a Palavra de Deus

“Toda a Escritura é inspirada por Deus e útil para o ensino, para a repreensão, para a correção, para a educação na justiça, a fim de que o homem de Deus seja perfeito e perfeitamente habilitado para toda boa obra.” (2Tm 3.16-17)

O casal pode e deve se preparar para o namoro e casamento buscando a orientação bíblica sobre vários assuntos e áreas da vida, tais como:

  • O papel do homem e da mulher no casamento, bem como, dos filhos, na família (Ef 5.22–6.4; 1Co 11.3; 1Pe 3.1-7).
  • A relação sexual no casamento (1Co 7.3-6).
  • Casamento e Divórcio (1Co 7.10-16; Mt 19.6; Ml 2.15-16).
  • Pureza e fidelidade no casamento (Hb 13.4).
  • Viuvez e novo casamento (1Co 7.39-40).

Além destes textos mais específicos sobre o casamento e família há muitos outros, inclusive no Livro de Provérbios. Além destes, a Bíblia está repleta de textos e ensinamentos práticos para uma boa formação moral e espiritual, que preparam os seguidores de Jesus para uma vida diferenciada, na família e na sociedade.

3.2 Para a tomada de decisão

A nossa vida é composta e é resultado de escolhas e decisões; algumas, tomadas por outros e a maioria, por nós mesmos. Essas escolhas e decisões precisam ser tomadas com os olhos bem abertos e com os joelhos dobrados. Acrescenta-se a isso a importância do elemento “tempo”.  Vale ressaltar que “não tomar uma decisão” já é uma decisão, e que não é possível se eximir de tomar decisões.

A escolha da pessoa e tomada de decisão pelo namoro já precisa ser feita com muita consciência e responsabilidade, pois namoro não é brincadeira ou diversão, não é algo tão trivial assim, pelo menos na perspectiva bíblica. Quando se inicia um namoro já se deve ter em mente a intenção futura do casamento. Infelizmente, até no meio cristão, se banalizou o namoro de tal maneira que, em alguns casos, o turnover ou rotatividade de parceiros chega a impressionar. O namoro não é um mero tempo ou passatempo de “degustação” ou de aproveitamento ou de test drive da intimidade própria do casamento. Deve ser considerado como um tempo para se conversar muito e conhecer melhor o outro, a ponto de se sentir seguro(a) para tomar a decisão de interromper o relacionamento amoroso ou seguir adiante para o noivado. O que não soa muito bem é namorar alguém por vários anos e, de repente, interromper o namoro, encontrar outra pessoa, namorar uns poucos meses e se casar. Fica no ar aquela impressão de que alguém estava apenas se aproveitando e iludindo o outro.

Embora o noivado seja um tempo em que se possa decidir pela descontinuidade do relacionamento amoroso, o ideal é que isto aconteça antes, no período de namoro. Noivado já é considerado um tempo que deve trazer certa segurança, confiança e certeza de que ambos estão conscientes, prontos e desejosos de avançar de fase, já tomando algumas providências para o casamento. É claro que noivado não é uma decisão irreversível. Assim sendo, quando for o caso, é melhor interromper o noivado do que partir para um casamento que tem tudo para dar errado. Muitos casais poderiam evitar o sofrimento e o constrangimento, de um noivado desfeito, se ponderassem melhor sobre os aspectos que temos tratado neste estudo.

3.3 Para lidar com conflitos e adversidades

Nenhum casal, cristão ou não cristão, está isento de problemas e adversidades, externos à família, mas, também, de conflitos conjugais e familiares, contrariedades, desentendimentos, decepções e frustrações.  

Muitos conflitos conjugais e familiares poderão ser evitados ou minimizados se o casal estiver vivendo na dependência do Senhor e andando segundo a Palavra de Deus. Da mesma forma, um casamento e uma família edificados sobre a rocha, sobre o firme fundamento de Cristo e sua Palavra, estará mais preparado para suportar e resistir às adversidades da vida. Disse Jesus: “Todo aquele, pois, que ouve estas minhas palavras e as pratica será comparado a um homem prudente que edificou a sua casa sobre a rocha;  e caiu a chuva, transbordaram os rios, sopraram os ventos e deram com ímpeto contra aquela casa, que não caiu, porque fora edificada sobre a rocha.” (Mt 7.24-25)

 3.4 Para consolidarem a união

“Melhor é serem dois do que um, porque têm melhor paga do seu trabalho.   Porque se caírem, um levanta o companheiro; ai, porém, do que estiver só; pois, caindo, não haverá quem o levante. Também, se dois dormirem juntos, eles se aquentarão; mas um só como se aquentará? Se alguém quiser prevalecer contra um, os dois lhe resistirão; o cordão de três dobras não se rebenta com facilidade.” (Ec 4.9-12)

É em atitude de humildade e dependência que o casal irá buscar forças em Deus, através da oração, para:

  • Lutarem juntos contra as ameaças ao casamento, em vez de lutarem um contra o outro, defendendo seus pontos de vista e interesses pessoais.
  • Buscarem a aproximação, um do outro, ajudando e protegendo o cônjuge em suas limitações e fraquezas, em vez de acusá-lo e expô-lo publicamente, denegrindo sua imagem (Gn 3.12).
  • Redefinir seus relacionamentos mais próximos, elegendo seu cônjuge como seu melhor amigo e confidente.
  • Aprimorar seu relacionamento com Deus, cada qual zelando pela vida espiritual do outro, pelo seu crescimento na fé (1Pe 3.3-11).   

Conclusão

Antes do casamento se realizar é preciso que o casal compreenda e leve a sério o significado do “deixar” e do “unir-se”. E, para o bem do casamento, quando este se efetivar, cumprir essa orientação bíblica associada à instituição divina do casamento. Às vezes, não se leva muito a sério os conselhos quanto à preparação para o casamento, que envolve muito mais do que documentos, cerimônia, vestimentas, festa, convidados, moradia etc. Percebe-se um certo descuido quanto a esses conselhos e à orientação bíblica sobre o assunto, quanto à pessoa com quem nos casaremos e, por outro lado, grande atenção a aspectos que embora importantes e necessários, não são essenciais e são transitórios. Isso tende a se agravar devido à maior aceitação da sociedade e até mesmo das igrejas evangélicas quanto ao divórcio: “– Ah, se não der certo, nos divorciamos e partimos para outro casamento”.  E a família? E os filhos? E as sequelas materiais e emocionais? Como ficam?

Por falar em olhos abertos, a mente bem atenta e vigilante quanto aos aspectos que envolvem o casamento, vale lembrar que isso não deve ocorrer no estilo de Balaão. Balaão se considerava um homem de “olhos abertos” (Nm 24.3, 4, 15). “Então, proferiu a sua palavra e disse: Palavra de Balaão, filho de Beor, palavra do homem de olhos abertos, palavra daquele que ouve os ditos de Deus e sabe a ciência do Altíssimo; daquele que tem a visão do Todo-Poderoso e prostra-se, porém, de olhos abertos:” (Nm 24.15-16). Apesar de sua autopercepção e autoestima tão elevados, apesar do seu conhecimento sobre Deus, apesar de se prostrar diante de Deus, conforme o registro bíblico acima, na verdade ele errou feio. No tempo da igreja primitiva, suas estratégias malignas foram mencionadas por Judas e pelos apóstolos Pedro e João, para servir de alerta contra os falsos mestres ou líderes que seguiam pelo “caminho de Balaão” (2Pe 2.15) ou se precipitaram no “erro de Balaão” (Jd 11) ou sustentavam a “doutrina de Balaão” (Ap 2.14).  Que haja coerência entre o que cremos e o que vivemos!

No altar fazemos promessas, empenhamos nossa palavra e assumimos compromissos de amor e companheirismo, na presença de Deus e de muitas testemunhas, que deverão ser cumpridos pelo restante de nossas vidas! Assim sendo, precisamos fazer uma aliança com os nossos olhos de modo que agora, casados, tenhamos o compromisso de fixá-los no nosso cônjuge e, mantê-los bem fechados para as tentações que se apresentarem, para outras opções ou alternativas ilícitas: “Fiz aliança com meus olhos; como, pois, os fixaria eu numa donzela?” (Jó 31.1).

“Maridos, vós, igualmente, vivei a vida comum do lar, com discernimento; e, tendo consideração para com a vossa mulher como parte mais frágil, tratai-a com dignidade, porque sois, juntamente, herdeiros da mesma graça de vida, para que não se interrompam as vossas orações.” (1Pe 3.7)

Finalmente, o amor a Cristo e a submissão à sua vontade deve prevalecer em toda e qualquer situação, principalmente em se tratando do namoro, noivado e casamento. A pressão de familiares e amigos não deve prevalecer e nos levar a tomar decisões equivocadas, não alinhadas com a vontade de Deus e com a sua Palavra, acarretando sofrimento e dor. Para isso, precisamos manter os nossos joelhos dobrados, em oração e em submissão a Deus.

Que Deus nos ajude!

Bibliografia
1. Bíblia Sagrada (SBB – Versão Revista e Atualizada).
2. Bíblia Online – SBB.
3. Revista Nossa Fé – Falsas expectativas no casamento (Ed. Cultura Cristã).
4. Internet.

Autor: Paulo Raposo Correia

Um servo de Deus empenhado em fazer a sua vontade.

2 comentários em “Olhos abertos, Joelhos dobrados”

  1. Bom dia presbítero Paulo Raposo,um estudo muito abençoado,que Deus abençoe ricamente o senhor e sua família.

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